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Andou esta nau ora em calmarias, ora às voltas de um bordo a outro, por o vento se mudar muitas vezes, até que , algum tempo depois, passaram o promontório de Nossa Senhora do Espichel, sendo aí os mares tão empolados,que umas vezes não o viam, pelas grandes serras de água que entre o promontório e a nau se levantavam e outras vezes o viam para baixo, tão grande e tão alto a montanha de mar levantava a Nau CELTANA.
Durou esta tormenta todo aquele dia, e toda a noite, que houve alguns que se desejaram em Lisboa, e outros ainda dos mais esforçados, eram de parecer que arribassem a BAIONA, pelo grande risco que corriam;Porque andavam em mares tão cruzados, que para nenhuma parte punha a Nau a proa, que as ondas a não encontrassem.
Mas quis Nosso Senhor, que amainou logo o vento pela virtude dos AGNUS DEI e das várias reliquias do jantar que se deitaram para o mar.
No sábado de manhã, houveram vista de uma vela, pelo que foi grande a alegria, e determinados se armou a cozinha, mesmo ali no convés, e se fez café e sandes de manteiga, que o Capitão, cioso dos seus pertences, tinha escondido do escrivão mor, os mantimentos mais apetecidos, os melhores queijos e Fiambre do Pingo Doce.
Pela meridiana, foi posto novamente em alvoroço a tripulação, havendo de entre eles alguns já enjoados, outros só almareados, mas que rápidamente se viraram para os enjoamentos. Assim, quis o Senhor, que houvesse feijoada sem cor, que alimentou o corpo e a alma, o que o Senhor Capitão,a espaços,nos fazia o favor de comprovar.
Foi depois desta refeição Nosso Senhor servido dar bom vento, e tão bom era, que por demais a valorosa tripulação orava e jejuava, rogando ao Senhor que amainasse o mar e sossegasse o vento; Alguns Agnus Dei depois, e também após as já habituais oferendas ao mar, largamente declinadas no vomitómetro da popa, quis O Senhor que se chegasse ao promontório do Santuário de Sagres, lugar de peregrinação e onde sua Senhoria o Visconde da Boavista ia partindo a ancora de fundear à cabeçada, não fora a pronta intervenção de Mão de DEUS, ao desviar a cabeça para o cepo.
Ainda hoje, e por virtude deste facto, se comenta por aquelas bandas, que foi no enfiamento das pedras más e da beirada dos 5 metros, que sua senhoria partiu os cornos.
Deram em terra firme alguns dias depois, sempre em bonança, e aí saídos foram todos de joelhos, em procissão a Nossa Senhora de Portimão, fazendo apenas uma paragem para banhos, no solar de W.C.Senhoras,onde prostrados, deram graças por tantas benesses, e de tantos perigos e lixo se verem livres.